Quando eu era criança, meus pais não me deixavam tomar café porque acreditavam que isso “retardaria meu crescimento”. Hoje se sabe, é claro, que isso é um mito. Estudos fracassaram inúmeras vezes em provar que o consumo de café ou de cafeína está relacionado à redução da massa óssea ou com a altura das pessoas.
Por muito tempo o café teve a reputação de ser ruim para a saúde. Mas, em quase todos os aspectos, essa reputação é contrária à realidade. Os benefícios potenciais para a saúde são surpreendentemente grandes.
Quando me propus a analisar as pesquisas sobre o café e a saúde, achei que o encontraria associado a alguns resultados bons e outros ruins, refletindo as matérias contraditórias que costumamos encontrar na mídia. Não foi isso que aconteceu.
No ano passado, foi publicada uma revisão sistemática e uma meta-análise de estudos que observaram o consumo de café a longo prazo e o risco de doenças cardiovasculares. Os pesquisadores encontraram 36 estudos envolvendo mais de 1.270.000 participantes.
Os dados combinados mostraram que aqueles que consumiam uma quantidade moderada de café, cerca de três a cinco xícaras por dia, tinham um risco menor de ter problemas. Aqueles que consumiram cinco ou mais xícaras por dia não tinham um risco maior do que os que não consumiam nenhuma.
Claro, tudo o que eu estou dizendo aqui diz respeito ao café – o café preto. Não estou falando das bebidas à base de café, com muito leite e açúcar, que muitas pessoas consomem.
Voltando aos estudos. Anos antes, uma meta-análise – um estudo sobre outros estudos, em que os dados são reunidos e analisados em conjunto – foi publicada observando como o consumo de café pode estar associado ao derrame.
Onze estudos foram encontrados, compreendendo quase 480 mil participantes. Tal como aconteceu com os estudos anteriores, o consumo de duas a seis xícaras de café por dia foi associado a um menor risco da doença, em comparação com aqueles que não tomavam nada. Outra meta-análise publicada um ano depois confirmou essas descobertas.
Complementando as preocupações sobre os efeitos do café para o coração, outra meta-análise examinou se tomar café pode estar associado à insuficiência cardíaca. Mais uma vez, o consumo moderado foi associado a um risco reduzido, e o menor risco estava entre aqueles que consumiam quatro doses por dia. O consumo teve de chegar a cerca de dez xícaras por dia para que qualquer associação ruim fosse constatada.
Ninguém está sugerindo que você tome mais café para melhorar a saúde. Mas beber quantidades moderadas de café está associado a menores taxas de praticamente todas as doenças cardiovasculares, ao contrário do que muitos podem ter ouvido falar sobre os perigos de café ou cafeína. Mesmo os consumidores pesados de cafeína parecem ter efeitos nocivos mínimos, quando muito.
Mas não sejamos tendenciosos. Há estudos para além da saúde cardíaca que são importantes. Muitos acreditam que o café pode estar associado a um risco maior de câncer. De fato, estudos específicos descobriram que isso é verdade, e estes às vezes ganham destaque na mídia. Mas, no total, a maioria destes resultados negativos desaparece.
Uma meta-análise publicada em 2007 descobriu que o fato de aumentar o consumo de café em duas xícaras por dia estava associado a uma redução de mais de 40% do risco relativo de câncer de fígado. Mais dois estudos recentes confirmaram essas descobertas. Os resultados das meta-análises que estudaram o câncer de próstata revelaram que, nos estudos de maior qualidade, o consumo de café não foi associado a resultados negativos.
O mesmo vale para o câncer de mama, onde as associações não foram estatisticamente significativas. É verdade que os dados sobre o câncer de pulmão apresentam um risco maior quanto maior o consumo de café, mas isso acontece apenas entre os fumantes. Tomar café pode ser um fator de proteção entre aqueles que não fumam.
Independentemente disso, os autores do estudo relativizam seus resultados e alertam que eles devem ser interpretados com cautela por causa dos efeitos confundidores (e muito provavelmente mais fortes) do tabagismo.
Um estudo que analisou todos os tipos de câncer sugeriu que o café pode estar associado a uma redução geral da incidência de câncer e que, quanto mais as pessoas tomavam, mais proteção era constatada.
Tomar café está associado a um melhor resultado nos exames laboratoriais de pessoas com risco de doença hepática. Em pacientes que já têm doença hepática, o café está associado a uma redução da progressão para a cirrose. Em pacientes que já têm cirrose, ele está associado a um menor risco de morte e um risco menor de desenvolver câncer de fígado.
O café está associado a uma resposta melhor ao tratamento antiviral em pacientes com hepatite C e a resultados melhores em pacientes com doença hepática não-alcoólica relacionada à gordura. Os autores da revisão sistemática argumentam que o consumo diário de café deve ser incentivado em pacientes com doença hepática crônica.
As meta-análises mais recentes sobre doenças neurológicas revelaram que a ingestão de café está associada a um risco menor de mal de Parkinson, a um declínio cognitivo menor e a um potencial efeito protetor contra o Alzheimer (e certamente a nenhum dano).
Uma revisão sistemática publicada em 2005 revelou que o consumo regular de café está associado a um risco significativamente menor de desenvolver diabetes tipo 2, sendo que o menor risco relativo (cerca de um terço de redução) estava entre os que tomavam pelo menos seis ou sete xícaras por dia. O estudo mais recente, publicado em 2014, usou dados atualizados e incluiu 28 estudos e mais de 1,1 milhões de participantes.
Novamente, quanto mais café você toma, é menos provável que venha a ter diabetes. Isto diz respeito tanto ao café normal quanto ao descafeinado.
Se qualquer outro fator de risco modificável tivesse este tipo de associações positivas em quase todas as áreas, a mídia não falaria em outra coisa. Estaríamos empurrando café para todo mundo. Verdadeiras intervenções seriam elaboradas em torno disso. Há muito tempo, porém, o café vem sendo considerado um vício, em vez de algo que pode ser saudável.
Isso pode mudar em breve. O relatório científico mais recente de diretrizes nutricionais do USDA [Departamento de Agricultura dos EUA], que eu já discuti antes, diz que o café não só não faz mal – ele concorda que pode ser bom para você. Esta foi a primeira vez que o conselho que elabora as diretrizes nutricionais revisou os efeitos do café sobre a saúde.
Existe sempre o perigo de ir longe demais direção contrária. Eu não estou sugerindo que comecemos a servir café para crianças pequenas. A cafeína ainda tem uma série de efeitos que os pais gostariam de evitar em seus filhos. Algumas pessoas não gostam da forma como a cafeína pode deixá-las nervosas. As diretrizes também sugerem que as mulheres grávidas não tomem mais de duas xícaras por dia.
Eu tampouco estou sugerindo que as pessoas comecem a tomar litros de café. Qualquer coisa em excesso pode ser ruim. Por fim, embora o café possa ser saudável, isso não é necessariamente verdadeiro para o açúcar e a gordura que muitas pessoas acrescentam às bebidas à base de café.
Mas já passou da hora de pararmos de ver o café como algo que todos precisamos cortar. É um acréscimo totalmente razoável para uma dieta saudável, com mais benefícios potenciais observados nas pesquisas do que quase qualquer outra bebida que consumimos. Está na hora de começarmos a tratá-lo como tal.